quarta-feira, 10 de julho de 2013

A maior de todas as necessidades

Durante evento em Lindau, na Alemanha, o Nobel de Física Steven Chu destacou que é preciso enfrentar a realidade das mudaas climáticas e que temos a responsabilidade de criar soluções para o problema, com base na eficiência energética e no uso de fontes renováveis de energia

Se a necessidade é a mãe da invenção, então as mudaas climáticas são a maior de todas as necessidades. Foi essa frase que o físico norte-americano Steven Chu, laureado com o Nobel de Física de 1997 por desenvolver métodos para resfriar e capturar átomos com lasers, usou para destacar, no 63º Encontro de Prêmios Nobel em Lindau, na Alemanha, a importância do desenvolvimento de soluções para combater o aquecimento global.

Segundo Chu, que foi secretário de energia dos Estados Unidos entre 2009 e o início de 2013, as mudaas climáticas são uma realidade. Ele citou levantamentos distintos realizados pela agência espacial norte-americana (Nasa), agência meteorológica e oceanográfica norte-americana (Noaa) e Universidade de Berkeley, que revelam que a temperatura média da superfície da Terra aumentou quase 1,5 ºC nos últimos 200 anos.

O físico acrescentou que o ritmo de subida do nível do mar, que pelos últimos 2 mil anos variou entre zero e 0,02 mm anuais, atinge atualmente uma taxa de 3 mm por ano. Por outro lado, análises de elementos presentes em amostras de gelo acumuladas há 650 mil anos indicam que houve picos de temperaturadevido à maior concentração de gás carbônico na atmosfera – e aumento do nível do mar ao longo desse período.

Por exemplo, há 120 mil anos, a temperatura média era 2 ºC maior e o nível do mar estava 6,6 metros acima do atual. “Isso quer dizer que o aquecimento que estamos vivendo é parte de um ciclo natural e não temos que nos preocupar?”, questionou o físico. E alertou em seguida: “Temos que nos preocupar e muito, porque os aumentos observados agora ultrapassam a escala estabelecida nos últimos 600 mil anos. De fato, eles ultrapassam os valores dos últimos dois milhões de anos.”
Steven Chu
O físico norte-americano Steven Chu, vencedor do Nobel de Física de 1997, foi um dos participantes do encontro que reúne nesta semana em Lindau, na Alemanha, 35 ganhadores do prêmio e 600 jovens pesquisadores de 78 nações. (foto: Fred Furtado)
Para Chu, temos que abordar a questão das mudaas climáticas por um ângulo epidemiológico, como foi feito com a associação entre fumo e câncer. “Mesmo não havendo um modelo, havia uma clara relação entre o hábito de fumar e o desenvolvimento de câncer. Ocorre o mesmo com a liberação de gases de efeito estufa pela humanidade e o aquecimento global.”

Eficiência energética

Chu apontou alternativas para combater as mudaas climáticas, como o desenvolvimento e uso de aparelhos mais eficientes do ponto de vista do consumo de energia. Ele ressaltou que as geladeiras norte-americanas hoje – embora sejam maiores que as de antigamente – gastam 22% menos energia do que em 1975, quando o governo dos Estados Unidos estabeleceu padrões de eficiência mínima.

“Elas também são mais baratas, o que pode parecer contraintuitivo; mas essa é a realidade que observamos também para as máquinas de lavar“, acrescentou o físico. “Ainda não se sabe as razões para isso, mas suspeito que tenha a ver com o fato de a indústria ter se adaptado à produção desses eletrodomésticos e ganhado eficiência no processo.”

O pesquisador citou ainda o desafio EV Everywhere (algo como ‘veículos elétricos em todos os lugares’), laado pelo Departamento de Energia dos Estados Unidos em março de 2012 e cujo objetivo é permitir que as companhias norte-americanas desenvolvam, até 2022, um carro de passeio elétrico para cinco passageiros tão barato quanto os equivalentes à gasolina.

“Já existem carros elétricos extremamente eficientes e que podem competir com veículos esportivos, mas eles custam 80 mil dólares e o que queremos é algo em torno de 20 mil dólares”, explicou o físico, acrescentando que, para isso, é necessário desenvolver baterias com maior densidade energética, durabilidade e tolerância à temperatura, além de reduzir seu custo. “Atualmente, elas custam 500 dólares por kWh, mas queremos chegar a 300 dólares por kWh em 2015 e 150 dólares por kWh em 2022”, revelou Chu.

Energia limpa

O físico também destacou a importância do uso de fontes renováveis. Ele citou o programa da Agência de Projetos de Pesquisa Avaados de Energia (Arpa-e), dos Estados Unidos, que procura criar versões melhoradas do pinheiro loblolly (Pinus taeda). Além de servir como matéria-prima para a fabricação de papel, a planta poderia gerar grandes quantidades de resina, rica em hidrocarbonetos.
 “Esse pinheiro já é cultivado comercialmente em 10 milhões de acres, mas tem o potencial de produzir bilhões de litros de biocombustíveis por ano em menos de 250 mil acres”, afirmou.

Reduzir o custo da energia solar é o objetivo de outro programa do Departamento de Energia norte-americano, chamado SunShot (algo como ‘tiro ao sol’). Segundo o físico, o programa tem como meta reduzir o custo atual dessa fonte energética, que inclui instalação e manutenção de um sistema eletrônico e uma placa solar, de 3,80 dólares para 1 dólar por watt. “As companhias elétricas estão nervosas com a instalação de painéis solares na casa dos consumidores e com o modelo em que elas são forçadas a comprar o excedente de energia de volta do cliente”, observou Chu. Para ele, tornar as empresas parte da solução requer criar um modelo que seja vantajoso para elas também.
Painel solar
Para Chu, a promoção da energia solar passa por um modelo que beneficie tanto as empresas como os usuários domésticos. (foto: Robert Linder/ Sxc.hu)
A proposta do físico é que as companhias elétricas sejam responsáveis pela instalação e manutenção do sistema – elas seriam as donas do equipamento, que contaria ainda com uma bateria instalada na casa do usuário. Esse armazenamento local é vantajoso para as empresas, porque elas não precisariam construir prédios para guardar as baterias e estas não estariam expostas a vento, chuva etc., além de servirem ainda como reservatório de seguraa para o cliente em caso de blecaute.

A redução dos custos das empresas seria repassada para os usuários, que teriam uma energia mais barata. “Todos ganhariam e as companhias elétricas seriam parceiras na expansão da energia solar; é economicamente vantajoso para elas apostar nisso”, ponderou Chu. O pesquisador ressaltou a necessidade de se investir também no barateamento da transmissão de energia. “Não adianta produzir, se não há como levar a eletricidade até onde ela precisa chegar.”

O físico ressaltou que temos uma responsabilidade moral com as vítimas inocentes das mudaas climáticas: as populações pobres e aqueles que ainda estão por nascer. “Há um ditado indígena norte-americano que ilustra isso: ‘não herdamos a terra dos nossos ancestrais, nós a tomamos emprestado dos nossos filhos’”, concluiu.

Por: Fred Furtado

Fonte: Ciência Hoje

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